domingo, 21 de agosto de 2011

A Árvore da Vida - O que existe além da história de uma família.

Quanto mais o cinema tenta se aproximar da realidade, mais ele se afasta. Essa afirmação se aplica principalmente aos filmes ditos comerciais, aos campeões de bilheteria.  Mulheres que não têm rugas ou  gordurinhas sobrando, famílias onde não há conflitos, personagens que não possuem dúvidas e clichês levados ao extremo dificilmente são reais. Mas não há como negar que isso é o que a grande maioria das pessoas querem ver. A fantasia da vida linda com tudo nos seus devidos lugares, a comédia despretensiosa, a história rasa que não faz pensar.

É por isso que A Árvore da Vida incomoda tanto.

Fui assistir ao filme  semana passada e confesso que me surpreendi. Foi um dos melhores que presenciei nos últimos anos. Uma história forte, que penetra profundamente no psicológico de seu personagem principal e também dos espectadores.

O filme incomoda mesmo. E isso é proposital. A intenção é tirar o público de sua zona de conforto, fazê-lo pensar, plantar a fagulha da reflexão, incitar. Mas afinal, essa não é a função da arte? E não seria também a função do cinema, reconhecidamente a 7ª arte?

Aí voltamos à discussão dos filmes que massificam, aqueles que entregam sempre repostas prontas. Os que te conduzem a um caminho que você já conhece, que muitas vezes não levam a lugar nenhum...



Respostas prontas você não encontra em A Árvore da Vida. Muito pelo contrário. É um filme denso, assim como seus personagens: um pai opressor, uma mãe doce, três filhos em diferentes fases da infância, e muitas perguntas que nascem nessa época da vida e nos acompanham até a morte.

Através de imagens que não seguem fórmulas, a partir de enquadramentos que em alguns pontos soam poéticos, noutros provocam estranheza, o diretor Terrence Malick, que ganhou a Palma de Ouro em 2011, tenta causar  no público  os mesmos sentimentos vivenciados pelo personagem principal ao longo da história. Conduzido por seus pais e por suas experiências, o filho mais velho se questiona o tempo inteiro. Ele questiona o porquê da vida, coloca em dúvida a existência de Deus,  põe na berlinda a importância dos valores. E, dentro desse contexto, imagens que poderiam parecer desconectas, fazem todo o sentido.

Ao nos depararmos com o universo em constante movimento, percebemos como somos pequenos, o que aumenta ainda mais a urgência de questões como "De onde viemos e para onde vamos?".

As cenas dos dinossauros servem para nos cutucar um pouco mais. Se eles, que eram tão fortes e dominaram a terra por tanto tempo foram dizimados, por que o nosso destino seria diferente? Só porque teoricamente somos civilizados, porque não pisamos na cabeça de outros da nossa raça, porque não nos devoramos uns aos outros? Será? Será que merecemos ser salvos porque somos melhores do que os dinossauros, porque somos bons?

As cenas dos dinossauros e do universo não passam despercebidas, mesmo que algumas pessoas não enxerguem alguns detalhes inextricáveis do filme. Nada é óbvio,  assim como também não é a vida. Se por um lado os galhos de uma árvore crescem para sentidos completamente diferentes, como o fluxo dos pensamentos, como nossas ondas cerebrais, estabelecendo conexões na maioria das vezes exdrúxulhas; por outro todas as árvores são presas às suas raízes, de onde retiram o alimento, fonte de sustentação.

Como as árvores, também estamos, de certa forma, presos às nossas raízes. Como o protagonista, percebemos que nossas experiências da infância deixam marcas indeléveis. E eu, como também tenho um filho homem,em alguns momentos  enxerguei a partir da perspectiva da mãe. Qual a minha função ao criar o meu filho? Como devo prepará-lo para a vida?

As questões são muitas e cada espectador vai formulá-las de maneira diferente.  O diretor deixa muito espaço para que o filme seja completado por nós. Existe silêncio suficiente para isso  (o que falta muito aos outros filmes e à vida real).

É por tudo isso que A Árvore da Vida é muito mais do que uma simples história de uma família. É a nossa própria história. E talvez seja por isso que incomoda.  Afinal, a maioria de nós prefere não encarar de frente coisas tão pungentes.

No dia em que  eu fui assistir muita gente saiu da sala no meio da sessão. No dia em que um amigo meu foi, um rapaz no fundo da sala gritou em alto e bom som: "Agora alguém me explica esse filme!"

E por acaso a vida faz sentido?